Maria Isabel afilhada do Zé Serralha

Maria Isabel afilhada do Zé Serralha

Zé Serralha, no meio da fotografia com dois amigos,  junto à Farmácia Gameiro em 1945

Zé Serralha, no meio da fotografia com dois amigos, junto à Farmácia Gameiro em 1945

«Fui eu que escrevi as frases no alcatrão» foram estas as palavras de Zé Serralha à sua afilhada Maria Isabel, dois anos antes do seu falecimento.

  «Ai de ti se abres a boca para dizeres quem foi!» Foi assim que José Francisco Varela, mais conhecido por Zé Serralha, se dirigiu ao padeiro da Padaria do Álvaro da Costa, única testemunha do feito, quando, em 1957, foi visto pela noite dentro a pintar as famosas frases na avenida junto à Igreja Matriz.

A sua afilhada Maria Isabel, hoje com 62 anos de idade, confirmou o que já se dizia só entre os amigos mais chegados. «Quando se encontrava já muito doente, com os seus 83 anos, chamou-me e disse-me: «fui eu que escrevi as frases no alcatrão». Faleceu com 85 anos a 5 de Setembro de 2003 e deixou saudades em todos aqueles que conviveram com ele. «Era amigo dos seus amigos» disse Maria Isabel. Um deles, o Sr. Flores, escreveu a 20 de Abril de 1958, na inauguração do Café-Restaurante Barrete Verde, um poema que representava bem quem Zé Serralha era: «Todo aquele que nasceu, viveu e morreu e nunca teve um amigo, nasceu, morreu e nunca viveu. Bem-haja José Serralha Varela que tantos amigos tem sabido cativar».

Maria Isabel lembra-se de muitas histórias do seu padrinho e em criança, segundo a sua afilhada, ele já revelava uma personalidade muito forte. Um dia, tinha ele 7 anos de idade, foi chamado para fazer um recado e, como estava na Igreja a ajudar o padre a cortar as hóstias, chegou atrasado. Quando a mãe o repreendeu, retorquiu «Cale-se lá senhora, estive a comer as migalhas de Nosso Senhor». (ri)

Lembra-se também de que quando frequentava a casa do padrinho, já adulto e casado com Joaquina Varela, esta pedia-lhe segredo por causa dos livros proibidos que tinha em casa. José Serralha lia Lenine e Karl Marx e chegaram a chamar-lhe comunista, mas era, acima de tudo, afirma a afilhada, uma pessoa sem partido nem religião, um contestatário que os donos das marinhas temiam. «Não o queriam a trabalhar nas marinhas porque ele incentivava os homens a protestarem contra as injustiças de um trabalho duro».

Sempre contestatário, chegou a festejar a morte do ditador António de Oliveira Salazar, em 27 de Julho de 1970, lançando um foguete pela chaminé de sua casa. Disse Maria Isabel: «mal se ouviu o foguete, a polícia andou pelas ruas à procura do autor e ele cá fora, a observar» (ri)

Homem empreendedor, não se ficou pelo trabalho nas marinhas a carregar sal, queria muito mais. Em 1957, tinha já uma pastelaria, a Leitaria Ideal, na Praça do Largo; em 1958 abriu o Café-Restaurante Barrete Verde e mais tarde foi dirigente do Grupo Desportivo.

Maria Isabel lembra-se também de que, em 1957, durante a greve dos salineiros, o irmão do Zé Serralha, Frederico Serralha Varela, foi preso durante as Festas do Barrete Verde, e levado para o Aljube. Aí foi isolado e torturado para que revelasse quem tinha sido o autor das frases. A P.I.D.E nunca soube de nada porque nem o irmão sabia quem tinha sido o escritor clandestino das famosas frases escritas no alcatrão em 1957, que levaram muitos salineiros a aderir à greve.

Entrevista realizada por Carlos Soares para o Jornal de Alcochete, em 2008

Nota: Quando esta entrevista foi feita o novo acordo ortográfico ainda não tinha sido aprovado.

Todas as fotografias foram amavelmente cedidas por D. Maria Isabel

Na Rua João de Deus  a  Dª Teodora e a  Dª Joaquina (namorada de José Serralha) José Serralha e Dª Maria do Carmo

Na Rua João de Deus a Dª Teodora e a Dª Joaquina (namorada de José Serralha) José Serralha e Dª Maria do Carmo

D. Joaquina  e José  Serralha na Leitaria Ideal. O primeiro negócio de Zé Serralha

D. Joaquina e José Serralha na Leitaria Ideal. O primeiro negócio de Zé Serralha

Folheto publicitário publicado pelo  Zé Serralha

Folheto publicitário publicado pelo Zé Serralha

Zé Serralha e D. Joaquina com amigos nas traseiras do Restaurante do Barrete Verde

Zé Serralha e D. Joaquina com amigos nas traseiras do Restaurante do Barrete Verde

Amigos de Zé Serralha  nas traseiras do Restaurante do Barrete Verde

Amigos de Zé Serralha nas traseiras do Restaurante do Barrete Verde

O Restaurante do Barrete Verde no tempo do Zé Serralha.  O sr. com o Chapéu é o Sr. Alves pai do carteiro Alfredo Alves

O Restaurante do Barrete Verde no tempo do Zé Serralha. O sr. com o Chapéu é o Sr. Alves pai do carteiro Alfredo Alves

Festas do Barrete Verde no tempo do Zé Serralha

Festas do Barrete Verde no tempo do Zé Serralha

Folheto publicitário  publicado por Zé Serralha

Folheto publicitário publicado por Zé Serralha

No largo de João de Belém.  Em cima o Sr. Joaquim Rana  e em baixo Zé Serralha.  A criança é o José Manuel filho do Sr. Rana.

No largo de João de Belém. Em cima o Sr. Joaquim Rana e em baixo Zé Serralha. A criança é o José Manuel filho do Sr. Rana.

Zé Serralha

Zé Serralha

Em cima ao meio Joaquim Rana e em baixo, do lado direito, José Serralha.

Em cima ao meio Joaquim Rana e em baixo, do lado direito, José Serralha.

António Catão Braga, João do Belém, Frederico Serralha e José Serralha em Espanha (Sevilha?)

António Catão Braga, João do Belém, Frederico Serralha e José Serralha em Espanha (Sevilha?)

Comentários mais recentes

01.09 | 14:24

Está foi segunda entrevista feita a um antigo salieneiro. A primeira entrevista foi feita em 1994 ao salineiro Anibal Figueiredo.Foi esta entrevista que me fez pesquisar sobre a luta destes salineiros

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